Paulo Freire é um mestre, isso todo mundo sabe, respeitado no mundo inteiro por sua forma simples e direta de ensinar. Desde a década de 1960, é considerado um mestre da alfabetização de adultos. Mas não só! Paulo Freire é um mestre da educação do ser humano.
Seus ensinamentos estão espalhados pelo mundo todo e são aplicados em projetos de alfabetização de adultos e educação infantil em países tão diversos como Finlândia, Cuba, Coreia do Sul, Japão, Hungria, Mongólia, Nicarágua, Armênia e o país Basco.
Mas, este não é um método aplicado no Brasil. Incrível, não é?
Quem afirma que Paulo Freire não é, na realidade, aplicado no Brasil é o historiador e doutor em Educação José Eustáquio Romão, seu amigo pessoal e especialista em sua obra, em entrevista à BBC onde diz que: "Paulo Freire nunca foi aplicado na educação brasileira. (...) Ele entra (nas universidades) como frase de efeito, como título de biblioteca, nome de salão."
E diz ainda que, no Brasil, o método Paulo Freire foi aplicado pontualmente e com sucesso em pequenos projetos mas, nunca, como política pública de educação. Este trecho da biografia de Paulo Freire mostra bem isso: “A metodologia por ele desenvolvida foi muito utilizada no Brasil em campanhas de alfabetização e, por isso, ele foi acusado de subverter a ordem instituída, sendo preso após o Golpe Militar de 1964”.
Para conhecer a biografia de Paulo Freire, dê uma lida aqui.
Uma das experiências mais comentadas de aplicação do Método Paulo Freire para a alfabetização de adultos é a de Angicos que já aniversariou seus 50 anos. Em Angicos, Rio Grande do Norte, foi feita a primeira experiência de alfabetização de adultos. Foram 40 horas de curso, só! Num primeiro momento foram alfabetizadas 30 pessoas e, depois, 300, em roda de leitura, com um grupo de "professores" que não o eram. Foi maravilhoso e causou um pavor enorme no patronato brasileiro.
A partir daí você vai entender, espero, porque é tão chocante que a Pedagogia de Paulo Freire não tenha sido, realmente, aplicada aqui no nosso país. E eu pergunto porquê essa “fuga brasileira” de se aplicar um método que é reconhecido, no mundo todo, como a melhor maneira de se alfabetizar qualquer pessoa.
Bem, a resposta deve estar na questão da ideologia que, para Paulo Freire, nada mais é do que a forma de se ver o mundo, e que depende do ponto de vista. Por isso diz ele que sim, na educação há ideologia, seja ela qual for, desde o horário de entrada, a posição das carteiras na sala de aulas, os uniformes e ainda mais acentuadamente, nos temas tratados, e na forma como são, ou não, aprofundados estes em sala de aulas.
Tudo é ideologia pois está, tudo, permeado da “forma de ver o mundo” de quem ensina, de quem escreve o livro didático, de quem detalha a política pública de educação. E, consequentemente, a liberdade de ensinar a partir da vida real cria consciência cidadã, consciência de ser humano, gente mais gente, e isso não interessou nunca a um sistema, o capitalista, que se apoia na submissão das classes exploradas aos desígnios do explorador e, para isso, o ser humano não pode pensar livremente, óbvio. Educar para trasformar é o lema de Paulo Freire.
No livro Pedagogia da Autonomia, Paulo Freire diz que a tendência do oprimido – ao incorporar o discurso, os valores e a atitude do opressor – é a violência física ou simbólica. Por isso mesmo a humanidade só avança quando os oprimidos deixam de tentar imitar seu opressor. Quando eles não querem trocar de lugar com o opressor, mas mudar as relações de opressão. E por isso que é raro na história isso ocorrer. Assista aqui um estudo sobre o livro.
Sobre a questão da sustentabilidade, o texto A Pedagogia de Paulo Freire como Saber Necessário à Prática da Sustentabilidade discute a formação de seres éticos, ártigo básico para que cheguemos, algum dia, à preservação real da vida.
Paulo Freire sempre disse: "não me repita, mas se considerar que alguma ideia minha resolve algum problema da realidade, reinvente essa ideia em cada contexto". Então, vamos a isso, a reinventar caminhos pois, ideias há muitas, e boas, mas não as devemos copiar.
A entrevista José Eustáquio Romão faz afirmações muito interessantes sobre a obra de Paulo Freire e apresenta a público o manuscrito da Pedagogia do Oprimido, texto que ficou desaparecido por décadas e que, por valer milhões agora está muito bem guardado. Espera o entrevistado que as novas edições do livro Pedagogia do Oprimido sejam corrigidas e reincorporadas a ele os trechos suprimidos anteriormente como o que trata da teoria da ação revolucionária.
Aproveito para deixar aqui um trecho: “Certa vez, eu estava no deserto de Góbi, na Mongólia, com o povo nômade, em missão. Em uma tenda, vi os criadores de cabra sendo alfabetizados por dois professores. Eu não entendia nada do que eles falavam, mas um nome soava meio familiar. Era Paulo Freire. Eles estavam com o último capítulo da Pedagogia do Oprimido nas mãos, traduzido para o chinês, que trata justamente do método de alfabetização”.